quarta-feira, 30 de julho de 2008

pG

Hoje à noite, eu jantei o desamor. Não foi tão difícil engoli-lo. As lágrimas quentes foram desconfigurando o primeiro sorriso que entreguei a ele. O silêncio havia preparado a queda sem atenuá-la. Hoje, eu senti o amargar do desencontro dos lábios que não sabem o que dizer. Eu não vomitei as palavras, nem me passou pela cabeça a fala poética-progressiva- nervosa-errante-usual. Minha cabeça pareceu um álbum calado de retratos embora singelos, lindos. Meu banco de dados murchou, parecia o fim, ainda parece, o é. Talvez ela, minha intensidade corrosiva, essa ânsia pelo grandioso, o tenha amedrontado. Talvez o amor centavo me valesse, não... Essa lucidez hoje não engana. A doença dos amorosos é viver a esperança da incerteza convicta do final. Não irei diminuí-lo, o pássaro que carregou meu amor nas asas voou rápido, e em mim a ventania que fez, não balançou só os cabelos. Quis tua vinda como uma ida à esquina, um café pequeno, um casaco, acabei por não lembrar que de fato, era isso. Agora já é tarde, o mundo podia ter acabado naquela noite, no grude dos corpos, quando fitaste meus olhos que concordavam. Um corpo só. Hoje, a noite me reservou uma jantar sozinha, numa mesa pra dois.

terça-feira, 15 de julho de 2008

Febre

O termômetro marca trinta e sete exatos graus. Sorrio na cama e na cama fico até que qualquer vontade acessória me mova a um objetivo razoável. Tenho febre. E é esquisita, não é uma febre fisiológica é a febre do pensamento. Porque ele nem bem saiu, e sua ausência arde. Não é a saudade incontrolável de novos amantes, esta que de tão linda e fugaz passa num banho frio de distância. É o calor da constatação da ausência, não dói não, nem lateja,não é ruim e não passa. Te faz sorrir perene dentro de si mesmo, tira as flores vermelhas já secas da jarra e coloca as marfim, sob o sol morno do amanhecer de inverno. Um calor diferente; parece que dei chá de camomila ao amor, e a fumaça embaçou tudo dentro. Uma vontade de agradecê-lo e agradecê-lo intermináveis vezes, sem que ele escute pra não parecer piegas, só por me fazer sentir, só pelo prazer de não ser tão rasa, só pelo amor desgarrado, só por ainda querer. Eu nunca ainda quis, mas ainda quero. Mais ainda quero. A continuação que não o fim, bem menos irrecuperável que antes, aquela que moldará minhas arestas às novidades sensíveis do mundo (nosso). Com infinitos trinta e sete bons motivos, para dividir o edredom.

sábado, 12 de julho de 2008

Âncora

Eu sou a amiga dos segundos, cuja noite agrava o pensamento congelado. Espero um porvir que não exista. Um porvir pouco anil, quase sépia de tão chocho. Eu entendo a ânsia coletiva daqueles que realmente com ele se importam, a invejo, invejo o motor daqueles que seguem lotados de uma coragem tão genuína e heróica. Esses que mesmo se perdendo no mar dos medianos, mantiveram os olhos abertos pro cais. Os amigos das horas que virão. Eu, no entanto, bebo na fonte salgada, dos não promissores. Nem subdesenvolvido, nem central. Só um país(inho) interessante que ninguém lembra o nome. Às vezes, a cabeça é tão fria que as árvores sorriem com suas enormes raízes complacentes, e as imito. É. Talvez a culpa seja da inércia das árvores. Eu posso me mover, dançar, chorar sentada em camas estranhas, pular com os braços para cima, gastar a sola e os pneus, ainda assim, tudo que quero ser é uma árvore. Elas são magras, antigas, intelectuais e fofoqueiras. Isso é ridículo. Invejo a labuta e durmo de tarde. Defendo pessoas e vou ao shopping. Eu amo o revés. E amo você também. Vocês, gente foguete. E saibam que eu nunca dei de ombros. Mas, é mais forte que eu. Os espero então na saída do teatro (à sombra do sucesso), contando os segundos, esperando do buquê que carrego no colo o bem me quer, os sorrisos e a as angústias do palco. Fazendo jus com meus amontoados de palavras à bela autobiografia dos outros.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Fim

Foi difícil, nós conversamos, ela não sabe dizer quando começa o fim do amor. Ela foi embriagando um monte de palavras, trocou as pernas e errou os abraços. Lembrou-me das brigas antigas, naquelas em que vermelha, gritava de raiva, até não poder mais, aí me abraçava, como quem escolhe antes o lugar do desmaio. Foi diferente. Ela disse que o fim de amor não tem memória. Eu não entendo nada do que ela diz, acho que é por isso, não a memória, o fim. É que ela fala bonito, é rebuscada sabe, não sei. Ela, na semana passada me ligou, perguntou por que eu não ligava, e eu perguntei por que ela não ligava, ela disse que sua frase era ambígua, nem me deu tempo de falar, “Você parece uma despedida” e desligou. Eu entendi, eu entendo. O telefone toca novamente, eu atendo, está mudo. Não estava mudo, tinha ela, orando esporros.

- Você não vai falar nada? – perguntei. O silêncio continuou. – Não espere que eu fale. Você sabe que eu não dou pra isso. Eu sou aquele que parte, não é o que você diz? Que sou aquele que parte?
Isso porque eu já havia partido, e também seu coração. E quando bem entendia eu partia, no início era assim, o amor ardia tão quente que me fazia ir embora. Era isso, não traição, eu nunca a traí. Ela dizia que a traição era só a iminência. Tá vendo como ela é? Ela é sauna (a vapor, embaçada).
- Sabe o que acontece?- começou o aparelho. – Acontece que eu vivi nossos últimos dias, e o pior é que você nem deu as caras, mas foi bom, talvez se desse eles não fossem últimos. Eu vou aí.
- Não! (o homem tem medo) Não vem agora, to ocupado.
- To indo.

O som de ocupado é solitário, muito. Nem vou ao espelho ensaiar o final, ela se bem a conheço, passou os últimos dias feito Narciso. Permaneço imóvel ouvindo a sinfonia telefônica, ela viria roubar meu posto. Viria até aqui, só pra partir. Tudo bem, eu concedo, veja como sou um bom homem, dou-lhe o prazer da partida, deixo para ela o fim do gênero.

Só que ela não vem. Dormi no sofá, com a porta aberta, perigando resfriar-me. Ela não vem e não liga pra dizer por que não veio. No dia seguinte, tentei não a esperar, sem sair do sofá. Mais um dia, e infantil, checo até a correspondência, fui ridículo. Foram três dias, t-r-ê-s dias.

- Cadê você? Não disse que vinha?
- Eu vou, to indo.
Acho que entendi o troço da iminência.

Veio. Algumas horas depois, me chega. Irreconhecivelmente bêbada. Meus vizinhos estão viajando e não por isso, fizemos amor de porta aberta. Feito macacos. Só ela gozou (do meu posto). Agora me parecia sóbria, e nua. Conversamos amenidades, enquanto eu vestia as calças, como se ainda fosse possível. Como se ela precisasse desse instante para organizar toda a confusão destilada do tempo a sós que tivéramos juntos, todo ele num gole só. Eu tenho pena do início, pensei. Num resquício de conexão, nos olhamos. Com pressa, fingi não entender.

Assim, sucedeu-se a briga, a irritação beirando a inconsciência, as frases e seus gumes emblemáticos aos ouvidos, a revelação das ratoeiras, as incríveis verdades e a agressão física completamente branda e ineficaz, uma mola (que precisou comprimir para distanciar). Ali sim, fizemos amor, o fim dele. E eu descobri, tendo-a sozinha em meus braços, onde começa, e há quem diga o contrário, mas não; é na mola, exatamente, o fim do amor começa ali.

domingo, 6 de julho de 2008

As tolas definições

É por isso que na tua selva, cujo chão espeta, estamos voando, talvez daí nasça o anseio de ser único, que não último. O único recorta o todo, o todo não-nosso é extinto, quando me tens nos braços. Quando nossa aurora proibida e preguiçosa nos traz ao mundo das cores, essas que suscitam as mais diversas reações. Quânticas, quantas, cantadas pelos cantos, clichês, incomuns, contrárias e carentes. Carentes de sei lá o que. Carente... Intransitivo.
E como sabes suprir no encontro das órbitas, com o teu bem dizer bem dito. No teu compreender ríspido, não te atentas das minhas bobagens predicativas, pareces um tolo dentro da tua pele a elogiar meus músculos e beijar-me a boca. Entretanto, o microscópio ainda está na caixa, agora não tem mais jeito, perdi a nota fiscal.
De saldo, fizeste-me um melhor poeta.
De saldo, deste-me o prazer da lava ao coração empedrado.
De saldo, arquivei todos os meus tantos planos em prol de não fazer nada.
Um nada que é tudo e não a ausência dele.


(Também, não me predisponho, a perder as noites que contabilizo insone, contabilizando um saldo não meu. Isso seria só adivinhar, só racionalizar o tudo, o nada, numa escala injusta. Minha escala é injusta. O saldo que ela (aquela ridícula que se remete a si mesma na terceira pessoa) resulta nele. Utópico. Eu nem penso, mesmo, nisso. Pois assim, ofereço-lhe (meu) tudo. E o resultado passa de predisposição à escolha.)

terça-feira, 1 de julho de 2008

No ar

Ai como a vida é dura não é mesmo? Só por termos nascido um. E um somente. Pudera eu ter nascido seu siamês, seriamos felizes. Afinal de contas, o amor de entes é algo sem explicação, e basicamente, tudo que tenho feitos há dias é tentar entender. Saber de fato, dissecar esse amor recoberto de mim. Chegando àquelas conclusões tão óbvias que merecem vida, amar não é igual e amar dói. Auto-explicação nos olhos dele quando fitam os dela, sem graça na noite escura. Seus olhos pedem amor. Difícil, tão menos difícil, quando só os olhos, estes sim em pares, sem respaldo daqueles, amornam. Eis que chega a solidão que te rouba a atmosfera. sabe o que a solidão carrega na mochila? Ar. Todo ele. E ficamos magros. O amor dá fome.

Insegurança é o que sentimos, nós os tudo. Já que aqueles processuais têm uma calma etária bem velha. Se morder sai coca? Não, saem dúvidas, muitas delas, asfixiadas aqui dentro. E são até mesmo injustificáveis, quando não infantis, mas pergunta amigo, pergunta mesmo sem resposta. Já não queremos elucidá-las, queremos só nutri-las de ar, para crescerem e nunca morrerem, só com o fim este infeliz. Quando no reencontro permanecerem bem quietinhas e serenas nos poros, você disfarça com o sorriso, e esquece-se dos olhos, óbvio.

Eu te amo é assim, óbvio, chato, difícil, doído, infeliz e um, um só, até o fim.

Rouquidão

Só enquanto eu puder dizer. Dizer tudo que pudesse ser dito, sem me privar dos apostos intermináveis. Dizer só por tentar fazer-me entender. Querer ser entendida. Eu sei que é pouco, só que é tudo perspectiva. Todo o meu objetivo é ser entendida, vai ver que é isso. Onde brota a fonte da prolixidade, eu tenho sede. Por ainda arder uma necessidade de soltar os cabelos, mesmo gostando pouco, só pra gastar meus grampos nas fechaduras das portas. Eu não vejo quase nada de portas semi-abertas. E não me apetecem as escancaradas, prefiro então permanecer belíssima, e penteada. Também há mais além da fala continua e ininterrupta, não é só um bolo de roupas sujas. Há um medo do silêncio, embora paradoxal sendo assim revelado. Tenho medo do que sussurro, mas o faço pois meus ouvidos podem estar cansados e deixe que os outros pares passem apressados pela cidade. Ninguém tem tempo pra essas bobagens. Ninguém tem tempo pra especulações. É tudo tão pragmático, tão cheio de regras. Talvez eu tenha Fanta laranja nas veias, eu não gosto de Fanta laranja, não gosto do gosto, porque não é completamente doce, porque é totalmente saciável, porque perde facilmente o gás. Só a cor mesmo, cor de laranja. Eu adoraria mostrar meu avesso. Adoraria a conquista verídica. Adoraria emprestar-lhes meus olhos. Adoraria se tecêssemos planos. Adoraria que todos dissessem, mas aí perdia a graça... a minha até. Às vezes queria aceitar indiferente, todos os predicados a mim atribuídos. Às vezes queria passear, só passear. Às vezes, confesso, me acho boa demais, às vezes péssima, por não fazer nada de bom com isso. Mas lembro que faço, e não tampouco, digo. Embora carente de charme, inflado de vontade e sem pedir licença, em meio a linhas e linhas de prosa (ou monólogo, tanto faz, não tanto faz, mas pra ser concisa tanto faz), eu diga ou sussurre ou grite ou trema ou sue esse sentimento meu, assim, sem nome.