quarta-feira, 23 de março de 2011

Insônia

E escrever de novo. De novo isso de fazer as coisas sem-sem querer. Fazer porque tem que. Porque meu coração está de novo escrevendo. E eu preciso obedecer, é coisa dele. Isso não é comigo.

Porque de novo as noites são mal dormidas, ou não dormidas, que sejam. É a noite lá fora. Lá não, ali. Aqui fora tem a noite que quer me ver.

“Natasha, por favor”

- Não, quero dormir, vou dormir.

“Natasha”

- Não é que eu queira, preciso.

“” (Esse é o silencio da noite, ela precisa estar calada pra que eu ceda.)

A boca da noite é a lua, eu sei. Nos dias em que ela não vem tá descansando ou tá cansada. Ou um ou outro. Não é descaso porque nós não somos disso. Tudo é visto. O que não é visto é porque não estava a mostra. Tudo é importante. Mesmo que poucas coisas. Ou uma coisa só, coisa alguém.
E a noite vai morrendo em silencio e nesse enquanto eu grito. De todas as formas que um corpo pode gritar sem dizer. Pra não acordar ninguém. E ser durão. E agir certo e levantar cedo. E respeitar as coisas, todas.
Mas eu, eu não quero ser durona e não sei ser assim e é bem verdade que noventa e nove vezes por cento de sempre eu desrespeito. Eu sou mesmo como ela, extensa e vazia. Que pede, e morre, e acorda, e pede e morre e acorda.
Alguém me ajuda? A lua tem me ligado, mas já sei o que ela quer de cor. Eu fico é morrendo de pena de não me atender.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

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Sentamos quatro. Dois de cada gênero. Um: “Os velhos se fuderam, só a ingenuidade é santa”. Da que não entendeu veio um brilho tão intenso, tão intenso, que calou todo mundo num sentimento muito próprio. Meu, confesso, quase satânica, senti foi inveja.

sábado, 27 de março de 2010

Bilhete único

O viço de urbano, não de transito, antes disso, o que pertence ao carro, o transito é grande demais pra mim, ao transito sou eu quem pertenço, ele é todo aquele cosmos em que se está e só, mal dessas coisas que servem pra ir e ir é foda, ir é pré-requisito, vai apenas, então é trânsito, nele sou eu que barulho, mesmo quando surdo. A engrenagem não, engrenagem e tilte, e uns barulhos de fail, isso tudo tá dentro. Porque tá tudo muito vivo, a gente pensa que não, porque é um barulho enlatado, mas se parar pra ouvir, o próprio silêncio não tá limpo. Tá ele lá se mexendo, urbano, viçoso.
O centro é isso. É o transito dos dias, de um monte de gente, de carro, de caixote, de umas comidas, uns cheiros, de ar e condicionado e pingo e prédio, tanto prédio que não dá pra escapar desse trânsito. A rota do cinza só varia numas pinturas de céu, e de uns morros que aparecem em perfeita hidrocor, tão longe e sozinhos que nem sei, será? Eu me distraio nesse pouquinho. Dessa rotina vazia, rotina vazia não, rotina do vazio; quisera meu trânsito cantar sem precisar ser ouvido.

sábado, 6 de março de 2010

Tá vivo

Agora é sério.

Eu quero ver aqui quem ganha.

Nem quero ver o suor no palco, porque cansa, e eu não sou de palco.

Nem quero ver um filete de choro, porque dói, e eu não dôo pouco.

Na verdade, eu digo que quero ver, mas não.

Eu quero é tocar. Tocar em tudo.

Pra essa ventania que tá aqui, fechada, dar vazão.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Vigia

É por abstinência produtiva que escrevo sobre este homem, que fica atrás da sobra e ali se excede ao despercebido. Por tratar de uma obviedade tão do jeito que coisas originalmente óbvias são, como que porque sim.
Acontece que dentro do que me falta está toda uma grande curiosidade,para então, um sentimento muito próprio de formigas e bichinhos curtos, desses que olham, e param quase que burros diante de tamanha... e mudos. E ficam tão intensamente pouco, até o limite do tédio e a continuidade de suas vidinhas. Uma espécie nossa de curiosidade contemplativa, me luziu desse moço. Já que sua interessancia não deve ser menos que rasa, e não porque sua cabeça não seja absolutamente relevante, apenas por ser esta tão misteriosamente trancafiada, que tanto eu quanto ele seriamos igualmente estranhos ao que se passa lá dentro. Portanto, no raso do que se pode ver foi o quanto compreentendi.
É um boné azul velho sobre a cabeleira branca e um rosto escurecido, não escuro, não amargo,não muito; de rugas cimentadas de tão vivas que são, mas isso por debaixo da barba também branca até o colarinho, que não sente calor, a blusa de manga ou mesmo casaco, mesmo dezembro e chinelos. Na verdade sua figura carece de um cachorro, como poucas outras carecem,é de enxergar ao seu lado o vira-lata cinza, com o pêlo de quem não secou a chuva e barriga de quem divide o que há daquilo que haja.
Perambulam os dois no sopé da ladeira em que moro. Na verdade, vigilante ele não é, porque no fim da rua a igrejinha faz com que embora seja, a rua não seja sem saída. É ela a razão da muita gente que passa por aqui sem morar, muita gente que carece de um vigia que não resida embaixo. Embora o velho não more na casinha sem cancela. A casinha é só um posto simbólico de segurança, já que tudo é, o homem se encarrega de proteger quando quer, sem lucro, prejuízo, e rotina lógica, inúmeras vezes ele faltou, ou desistiu de ir, chega atrasado ou sai mais cedo do horário normal que se quer. Ele e ele mesmo resolvem, e não sei, mas o consenso não me parece pacífico, às vezes, me parece que ele está nessa porque... por alguma razão que descubro e na mesma hora tranco.
Então passo de fininho ali pra não incomodar, mas ele grita de lá um bom dia rabugento, rabugento não, ressentido, mesmo; só que às vezes, também, quando sou eu quem grita, por pensar que talvez o que exista não seja enfim tão mistério, por pisar nas formigas sem querer, porque Eu sou grande; não que ele finja, simplesmente esse homem não me vê.

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Meio meu

Ela se espalhou na cama. Bonita, com colcha marrom e estrelinhas que tem uma bola dentro, não são bem estrelinhas, são tipo só losangos. Ela também era bonita, mas vestia preto e as bolinhas na roupa eram em alto relevo. Qualquer abraço não viria só macio, seria relevante. Mas nunca foi de muitos abraços. Abria uma boca ácida, quando, por favor, a acidez dos outros conflita muito com a nossa.

- Olha, olha bem, você jura que essa mulher não é bonita?

- Ué, juro.

- Burro!

(-Tá, é, óbvio.) (Bancando o mau ator)

E não somente, porque este azedo, conflitava com a posse. Quando, por favor, a posse é tão inventiva.

- Ah é? Então “suponhamos” que você estivesse comigo, você ficaria com essa pessoa?

- Não... Nunca... Estaria só com você.(Bancando o bom ator)

- Mentira!

Quer dizer a posse aí não está tão clara, só pra quem pudesse perceber profundo os olhares acusativos dessa primeira frase. É a mãe já com o chinelo na mão e o filho com a boca suja de marrom, mas mãe eu juro que não comi o chocolate agora, guardei pra depois, e também eu juro que vou comer tudo no jantar. (É claro que a criança entrega em especial depois dos tambéns, mas também o tempo tinha que trazer qualquer coisinha de bom; ser sutil adianta com os poucos vividos e ameniza com quem se deixa amenizar. Aliás, vivência é tão sutil que tem muito pouco a ver com tempo.)
Apenas para o deleite da prosa é que faço a distinção das posses. Posto que não há relevância alguma no tópico. A posse do “isto é meu” é um pouco burra pras coisas materiais, só não é de fácil percepção, já pras imateriais é quase que completamente boçal , mas todo mundo insiste em mantê-las na idéia de não-fácil percepção. Certo, a saída para os não céticos é que perdoar ainda é divino; pros céticos, fica a racionalidade mesmo. O outro tipo é quando “isto não é meu, mas eu ajo como se fosse”. Risos. (Tem isto no diálogo supracitado, agi como se pudesse ser engraçado.)

Tem outra coisa também: “isso é muito meu”. Só que isso aí, tem posse zero. É só uma manifestação imprescindível e auto-suficiente que constata. Na verdade, serve pra muito pouco, quando em muita, chata, e quando certa, bela.

- Outro dia eu tava passando pelo Aterro, naquela parte que as árvores dão licença pro mar, e ai vê-se um pouco dele, um pouco de pedra, um pouco de prédio, em meio à tudo sabe? Daí falei, meio que em voz média, do tipo deu pro cara do lado ouvir e ele tava um pouco dormindo, O Rio é lindo.

- Po, isso é muito seu.


Vê? É bobo, quase bonito, com lapsos de imprescindível, e isso é muito meu.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Eu vou pra um dia vôo