sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Seu

Oi, vem cá, a gente precisa conversar, aliás, a gente não. Eu preciso te dizer.
É que... eu, eu não sou normal.
Eu sei da sua vida, sei que você tem namorada, sei que você a ama, sei que ela é incrível, sei de tudo. Talvez por saber disso é que eu tenha te escolhido.
Eu sei que eu não tenho vocação pra substituta, amante, essas coisas, porque se algum dia eu tiver alguém, eu quero esse alguém por inteiro. Então eu nem cogito essa possibilidade.
O fato é que eu adoro essa sua timidez, eu adoro a sua distância, o seu incomodo, o seu cabelo, eu adoro saber que você muda o cabelo, eu adoro ver o seu falso interesse em assuntos desinteressantes, eu adoro te ver nunca, adoro você ser heterossexual, eu adoro o seu gosto, adoro suas roupas,eu adoro o cachorro, adoro sua música , eu adoro você.
Não... não precisa ficar sem graça. Isso vai ser um discurso e ponto. Eu não seria capaz de dizer tudo isso, se algum dia pensasse em me envolver com você.
E digo mais, esse é um você pelo meu ponto de vista, eu sei que você não é isso tudo, porque ninguém é. Aham... eu sou exigente. Não, não... pode ficar feliz. Você aparentemente tem tudo o que eu procuro num cara. Um cara que eu nunca vou achar, ou melhor, achar vou. Mas nunca vou ter. Um você inexistente.
Porque atrás dessa moça super bem resolvida e falante, segura de si. Há uma outra que tem medo de tudo, tem medo de se doar. Aqui atrás tem uma fortaleza boba, uma muralha antiga que não serve mais pra nada, é só peça de museu.
O que? Você nunca mais vai olhar na minha cara?
Eu quero saber quantas vezes você já me encarou?
Ta ...eu não quis ser encarada, eu não me sinto bem, mesmo. Eu não entendo essa timidez também, não me pergunte.
Não... eu estou completamente sóbria. E por mais incrível que pareça eu quase nunca fiz isso. Não, não é um hobby meu, e por favor não ironiza. Não fica legal em você. Estou sã querido, sã como nunca estive.
Resolvi sofrer por amor. Já que não amo ninguém de fato, e talvez, nunca tenha amado alguém. Resolvi que você é digno.
Digno de ter o meu amor que raro será seu, até porque acho que você dispensaria. Logo, você não vai ter uma coisa que você não quer porque é algo que eu não posso dar. Eu não sei dar amor. E quando eu digo que eu quero aprender, eu não minto. Eu juro!
Por favor não se sinta mal, eu não peço muito, não quero um escândalo envolvendo traição e beijos, não... o dramalhão sou eu. Só peço que ouça e entenda. Ou finja entender. Pensa que nem é com você, porque pode nem ser.
Isso tudo é comigo, com o tempo você entende. Eu quero que você queira, mas aí eu vou ser má, não posso ser. Não mais!
Agora vai, não diz nada, ou melhor diz “ok”. Ok !

"I can't help it if you might think I'm odd"


quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Outono meu

Vou todos os dias ao mesmo parque. Ele é o mesmo parque de sempre. Eu, já não sei. Vou ao parque visita-lo, sob pretexto de passear com o cachorro. Mas o passeio acabou tornando-se desinteressante para o cão. Então, não sei se por respeito ou amizade este me acompanha diariamente. Caminhamos até lá. Na entrada há um portão de ferro antigo, enorme e sujo, ele é que impõe o parque. Além de delimitar o lugar, peneira os freqüentadores do mesmo. O público-alvo, ou melhor, a platéia.
É sempre muito bom assisti-lo, contemplá-lo. Com suas árvores austeras e seus pássaros, que não são passarinhos, o tapete de grama intenso e nunca verde, alguns poucos bancos, nada monumentais, bancos simples, que um dia provavelmente foram brancos. Há também um lago, um chão de mar tão calmo quanto negro. Há pessoas, mas prefiro não as notar, estas são o cenário em si. Há... há outono. O outono do parque... sou eu. É quando as árvores se permitem, quando elas cedem, porque já não agüentam, assim provam o que são, esqueletos de madeira velha imóveis, num chão sujo de folhas, e não flores, folhas, secas.
O parque era um museu para mim, apenas o observei durante anos, nunca mexi numa folha(palha) sequer, e me prometi fazer o mesmo com as pessoas que passavam por ali. Não por falta de interesse, talvez por ritual. Eis que certo dia surge uma mulher. Era outono. Essa mulher chega e se senta, não traz um livro, nem um cão, nem bolsa ela carrega. Os cabelos negros, a calça jeans, a blusa branca e as sandálias são todos os adereços que traz consigo. Senta-se e olha, apenas.
Olha atentamente o que ninguém vê, o que eu, durante todo esse tempo nunca pude perceber. Ela foi a serenidade das árvores, com a paz do lago e a leveza das folhas que caem. Ela absorveu tudo ali, e apaixonadamente, fui absorvido pela mulher. Nos dias seguintes, não mais fui ao parque, mas ao encontro da tal óbvia misteriosa. E sim, ela apareceu. E reapareceu, talvez apenas pra consolidar o nosso amor. O amor do eu-parque. Eram encontros matinais e secretos, ela nunca deveria saber.
Uma noite ansioso, fui ao bar comprar... nada, apenas sai de casa, então a encontrei.Lá estava ela, acompanhada de um homem alto e entretido com uma criança nos braços. A mulher olha para meu cão, e o mostra para a criança, que sorri, bate palmas e babulcia coisas. O olhar dela então encontra o meu, e demora. Retraio toda e qualquer parte do meu corpo e suo frio, ao contrário, ela derrete um sorriso, e o que mais me assusta é que demonstra familiaridade. E a minha razão vai embora de mim, acompanhada. A esperança de revê-la foi se esgotando a medida que ela faltava aos nossos encontros.O motivo finjo não saber.
Deixei de ir ao meu parque, porque perdi o amor que não tive, perdi o porquê, agora vou ao parque somente, e completo o cenário.

desmistificação

Boa tarde, ahn... o processo é simples
eu chego, me aproximo
te toco e te mato
você me toca e morre

estou sem tempo, bem-vindo à vida!

sábado, 18 de agosto de 2007

Filho único

Onde a casa mora?
Onde tá o pai?
Cadê que não volta
Que não volta mais.

Diga que sim, fui
E o filho volta
Volta a casa, volta a casar
Volta mais dois, três
Ou volta só

Cadê a casa?
Pronde o pai foi?
Não consigo achar
Onde é que fui, não sei
Daonde volto, eu vou

A casa eu fiz
O pai já foi
O fui sou eu
Só, eu estou.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

gentinha

Porque essa gente é macia, flexível?
Flexível no pior sentido da palavra. No sentido de quem não contesta. No sentido do aceito.
Essa gente que entra, pede, recebe e sai sem pagar, é feliz, porque... está bom.
Gente gratuita. Vão e voltam gratuitamente, porque... assim é fácil.
Gente... eles e elas.
Nós, não. Eu, nunca!
Gente corriqueira. Gente ordinária, mentes fáceis, rasas.
gentINHA
Não faz meu gênero. Garçon a conta por favor!

terça-feira, 14 de agosto de 2007

O vislumbrado

É essa mulher que pisa em notas musicais, é a mulher sinfônica.
Aquela que derruba uma multidão com o olhar, e que, com esse mesmo conquista legados.
A mulher fortaleza da qual não se pode chegar perto. A tal que me aflige, afaga e depois ignora, ou apenas isto. A sedutora voluptuosa e casta mulher que passa.
A mulher que traz consigo o perfume-poção, que se encharca deste sem precisar sequer de uma gota do frasco.
Uma tal que não sabe que posso oferecer-lhe o mundo e o que mais ela almejar, e mesmo sem conhecê-la. Porque essa mulher tem seus desejos estampados na face. Cada movimento seu é um pedido que eu, com a devoção de um escravo ao seu senhor, irei realizar.
Iria, mas não vou.
Porque é a mulher demoníaca, que conquista apenas pelo prazer desta. O prazer quantitativo. Demônio!
Ela me tem por inteiro.

sábado, 11 de agosto de 2007

Estão servidos?

-Entrem, por favor, entrem!
Querem carpaccio?
carpaccio de língua. Língua de Natasha.
É minha mesmo, agora sim estou incomunicável, quero saber o porquê do amor verdadeiro casual. Mentira!
Não quero desvendar nada, ponto.
Querem minhas respostas ? meu acalmar? pois eu calo
Querem meu mau-humor? minhas exigências, as chatices? eu calo também.
- Chega, pra mim, já chega!
Monólogos. Parece que tudo que eu sempre fiz foi monologar. E também inventei coisas, inventei nomes, inventei linguagens, inventei vícios, cuspi palavrões demais. - Natasha você cospe palavrões por demais. Pois cuspia!
Criei muita coisa. Fui podre.
Quis aparecer, apareci. O lingua maldita. São muitas cantigas de escárnio e de maldizer.
aaa não... eu tambem fiz juz ao amor, isso fiz! Adorei muita gente, lugares, situações e me adorei muitas vezes.
Uma hiena, um escorpião que morde com a língua e/ou alguém que fala a língua dos anjos.
Ex-língua queridos, hoje sirvo carpaccio.
Venham e deliciem-se com um único pedaço de mal e bom caminho na face da terra, aí então...
- Calem-se !

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

Há melancolia. Parece que um eu não era feliz e assim sem mais nem menos passou a ser e agora sente que periga revirar de ser triste.
Há saudade, saudades de alguma coisa ainda viva, minha. Saudade dos dias bons e dos bom dias, saudade da vida cor de rosa finita, do tempo das vacas mais cheinhas. Saudade há.
Há lucidez, há sim. Porque não sei muito de tudo e sei disso. Porque ando atento. Porque as vezes desligo, mas aí não sou eu. E, por ter olho clínico há lucidez.
Há também bom caratismo, generosidade, há sorrisos gratuitos, bom humor. Há carência e vivacidade.
Há isso tudo em mim, mas também há o revés!
O eu de verdade perigou ser feliz, mas nunca deixou de ser triste. E convive bem assim.

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

Há diferença no Distrito

Um lugar mítico. Um mito. Um poço de emoções, sendo este sem fundo.
Deeper
Todos os que chegam tem sede.
A vida, sub-vida surreal que aqui se pode obter. Propiciar.
Universo paralelo de pessoas paralelas e opções aversas a resultados ideais.
Aqui tudo se quer e nada se tem.
Há positivo e negativo ocupando um mesmo lugar no espaço. Compasso. Com passos.
Movimentos. Que movimentam e energizam esse lugar derradeiro.
A mortalha dos dias que duram para sempre.

terça-feira, 7 de agosto de 2007

A melhor noite não vivida

Ele abriu a porta olhou pra fora do quarto e não viu a mãe, talvez já estivesse deitada, já passava das nove e então percebeu que estava atrasado. Tomou um banho morno, a toalha de plástico florida delimitava o espaço necessário pra o corpo magro de um rapazote dessa idade. A pressa o faz escorregar e bater com o dedão no sanitário, ele então deixa as pegadas bicolores vai até o quarto da mãe e pede band-aids,que sonâmbula oferece um esparadrapo. Então ele volta correndo pro quarto desviando dos passos anteriores. Põe a melhor calça, uma camisa azul clara do ano passado e sapatos apertados, o pé reclama e ele ignora. Volta ao banheiro pisa no tapete encharcado por falta de espaço, e procura pela brilhantina. Pronto, está pronto. Faz um terceiro caminho, grita um boa noite qualquer e bate a porta.
A mãe trabalhava como garçonete de uma lanchonete próxima, o rapaz passa por lá. Recebe olhares de todas as mesas e elogios dos empregados conhecidos. Talvez só tenha parado ali, para ganhar essa aprovação. Isso infla seu ego. Sabia que não era rico, mas só por falta de dinheiro. Segundo sua mãe, Josh tinha classe, não era um pobre pobre,um pobre coitado, era somente pobre. Ele entende e caminha, está atrasado e sabe, mas não corre, nem anda depressa. Caminha.
Não passa um carro sequer, a calçada parece se alargar enquanto ele passa, e vai assim pé ante pé, sem pressa de chegar ao destino, assobiando o nanana final de "Hey Jude". Tudo pode esperar, porque agora era o momento, o único momento da noite no qual ele poderia ser o protagonista. E se tudo desse errado não faria a menor diferença. Os passados cinco minutos seriam os mais felizes de uma vida inteira. Pensando nisso surge um pré-sorriso, ele olha pra cima, há um céu sem estrelas e mesmo assim sorri, pensa em si mesmo, olha para os lados, vê que não é observado e pode gargalhar.
Acabou, sabe o endereço de cor. Trinta e cinco é aqui. Puxa o ar como quem se prepara pra passar muito tempo debaixo d’água e o solta vagarosamente e de com uma intensidade linear. A casa tem pontos de luz estratégicos e é branca por fora, ele pensa na dificuldade de se manter uma casa branca assim tão bem pintada. Abre o portão de ferro, olha pro jardim igualmente conservado, pensa no quanto sua mãe ficaria feliz com um chafariz daqueles em casa. Se impressiona até mesmo com as pedras que fazem um mosaico no chão que ele pisa,e se esforça pra andar na parte escura. Josh tem TOC, mas não faz a menor idéia do que seja isso.
Toca a campainha. O pai dela abre.
- Boa noite senhor Paul, vim buscar a Claire pro baile.
- Você é o tal Josh?
- Sou sim senhor.
- Queira entrar por favor.
Era isso que ele temia.
O tom de voz do pai. O sorrisinho falso da mãe dela e seu taier marrom. O sofá gigante. A cor bege das paredes. O lustre mal preso. A música ambiente. Tudo ali era clichê, tudo.
- Ela já está vindo. – disse a mulher movendo apenas os lábios. Imediatamente após a mulher testa o vinho branco e olha pro marido. Aliás, olha o perfil deste, que permanece imóvel olhando não se sabe se para o relógio ou para a janela que ficam na mesma direção. Josh percebe as mentiras da casa.
O som do salto alto no piso de madeira ecoa pela sala, cada passo de Claire faz com que o menino se arrepie. Ele esquece que está ali. Começa a fantasiar como a menina vai estar vestida. Será que vai usar aquele vestido branco que eu gosto, mas ela prefere o tal rosa. Não... ela não é de repetir roupa. O cabelo vai estar preso ou talvez solto, ela fica bem dos dois jeitos. Sente-se quente, finge um bocejo e sente a face enrubrecer. Ele pensa que gosto teriam os lábios da menina. O toque na pele macia. A temperatura da respiração. A contagem das sardas. O encontro de olhares.
Eis que ela aparece no segundo andar desce a escada, dá um beijo na mãe, entrega os braços ao pai, e Josh acha aquilo estranho se deixa mentir, então sem sequer olhá-lo, anda até o rapaz. Ficam paralelos e caminham assim até a porta, que é grande mas não o suficiente, então ele a deixa passar. Fecha os olhos e a porta, repete os movimentos anteriores à entrada na casa, porém com menos ênfase, e os dois como se fosse combinado dizem ao mesmo tempo:
-Oi.
Sorriem.
Josh acorda, abre a porta olha pra fora do quarto, já passa das nove , não vê a mãe. Dormiu demais, está atrasado. No banho sorri, sorri pois vai ter a melhor noite da sua vida.

segunda-feira, 6 de agosto de 2007