domingo, 6 de abril de 2008

Só amor

Deixa assim mesmo, já que tudo acaba um dia. Porque o eterno é falso. E se ainda é funcional nosso romance, e se o prazer, ainda que pouco, ajude. Depois de um tempo não mais se arrancam os botões, nem por descuido nem por cuidado, mas preguiça. Tudo era botão antes de florescer e ficar seco. Tem medo de nem ter mais o botão na memória. A manteiga ta aqui, o relógio ta ali, o isqueiro ta lá dentro e as chaves tão no bolso esquerdo do paletó cinza no armário dos fundos na porta do meio. Mas só sabe isso, e nem quer saber. Já que as noites não são mesmo no escritório, e ele sempre soube onde estavam os potes que ela guardava a calma. Com o tempo não tem mistério, e seria feliz deixar só assim mesmo. Só que não. Porque o silêncio é triste, a cama é fria, os discos são velhos, os remédios acabaram, as contas foram pagas, a comida ta na mesa, o espelho não ajuda, o telefone não toca, não há nada com os amigos, nem com os livros, nem com as flores, nem com a chuva, nem com eles mesmos. Não há nada com eles. Só amor. São as vítimas culpadas por um assassinato mútuo e sem obituário, não vem ninguém ao enterro.

Um comentário:

B. Piovani disse...

Eterno é o amor e falso é aquele que a gente cria. Criamos para para suprir a falta do real.
O silencio é triste porque os pensamentos não calam, a cama é fria porque não há os braços protetores, os discos são velhos porque as canções não ecoam como antes, a comida a espera na mesa, os amigos não ocupam o vazio...
Acabou o amor ou apenas se despertou da ilusão?